Direitos humanos não enfraquecem operações: eles salvam tropas, fortalecem o Estado e aumentam o poder operacional

Afirma pesquisador militar especializado em fronteira e operações na selva

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Em um momento em que operações de fronteira na Amazônia ganham atenção nacional e internacional, o debate sobre como equilibrar combate ao crime transnacional, proteção de comunidades vulneráveis e emprego da força se torna cada vez mais central.

Para compreender esse cenário, a reportagem conversou com Bruno de Alcantara Barbosa da Silva, bacharel em Ciências Militares, pós-graduado em Direito Internacional dos Conflitos Armados e Direitos Humanos e pesquisador especializado em segurança de fronteira, com experiência prática em operações de selva, áreas isoladas e unidades de alta prontidão.

Além da formação militar e jurídica, Silva possui certificação internacional em direitos humanos aplicados a operações militares pelo Peace Operations Training Institute (POTI), instituição reconhecida pela capacitação de militares e especialistas envolvidos em missões de paz e no emprego prático do Direito Internacional Humanitário em ambientes sensíveis. Essa base técnica reforça sua atuação na interseção entre operações na selva, fronteiras remotas e proteção de civis.

Autor de estudos científicos sobre combate moderno no ambiente amazônico, Silva defende que direitos humanos não são limitações operacionais, mas ferramentas técnicas indispensáveis para quem atua na linha de frente.

ENTREVISTA

Por que ainda existe resistência ao tema dentro do contexto militar?

Silva: Durante muito tempo, direitos humanos foram apresentados apenas como teoria, sem conexão com o cotidiano da tropa. Isso cria uma sensação de distância. Mas, quando analisamos operações reais — especialmente em ambiente de selva, onde cada decisão tem impacto estratégico — percebemos o contrário: os direitos humanos aumentam a segurança jurídica da ação, a eficiência da tropa e a proteção institucional.

É preciso lembrar que soldados e comandantes respondem por suas decisões. Quando esses profissionais dominam os parâmetros legais, eles operam com mais confiança, precisão e legitimidade.

Em termos práticos, como direitos humanos fortalecem operações na fronteira?

Silva: Em três níveis:

Proteção do próprio militar

Quem entende as regras reduz drasticamente riscos de responsabilização e evita decisões que possam comprometer a operação ou sua carreira.

Fortalecimento institucional

O emprego da força sustentado por bases legais impede narrativas de abuso, reforça transparência e eleva a credibilidade do Estado — algo fundamental em áreas sensíveis.

Eficiência operacional

Princípios como proporcionalidade, necessidade, distinção e cadeia de custódia aumentam a precisão, reduzem erros e ampliam a qualidade das ações táticas. Esses fatores não atrapalham — otimizam.

A Amazônia apresenta desafios muito específicos. Direitos humanos fazem diferença mesmo em terreno tão hostil?

Silva: Fazem ainda mais. A Amazônia combina populações vulneráveis, áreas indígenas, presença de organizações criminosas transnacionais e uma geografia que favorece erros de avaliação.

Em um ambiente assim, inteligência, calma e disciplina são mais importantes do que força bruta.

Além disso, qualquer erro na selva isolada se torna assunto nacional em minutos. A aplicação correta de normas reduz riscos estratégicos para o militar, para sua unidade e para o Estado.

É uma forma de blindagem institucional.

Há quem afirme que direitos humanos atrapalham o combate a crimes fronteiriços. Como responder a esse argumento?

Silva: Na prática, o que atrapalha operações não são os direitos humanos — é a falta de técnica.

Quando uma ação é mal planejada ou mal documentada, ela pode ser invalidada depois.

Quando respeitamos regras de engajamento, encadeamento probatório e uso proporcional da força, a operação se torna mais sólida.

Direitos humanos não impedem o combate. Eles impedem erros. E erros fortalecem o inimigo.

Como esse conhecimento é aplicado em missões reais?

Silva: Hoje, criminosos transnacionais usam a selva como escudo e se misturam a comunidades locais. Normas humanitárias ajudam a tropa a: conduzir abordagens precisas, registrar e preservar provas, diferenciar ameaça real de presença civil, proteger populações vulneráveis, utilizar a força quando necessária — e evitar quando não é.

Essas práticas não são “suavização”, são técnica profissional. Países com forças altamente treinadas fazem isso há décadas.

Qual é a mensagem para o militar que desconfia dos direitos humanos?

Silva: É simples: direitos humanos são um manual de proteção operacional.

O militar que domina esses princípios: age com mais segurança, comete menos erros, reduz riscos jurídicos, fortalece a imagem do Exército, conduz operações mais eficientes, e aumenta a chance de sucesso da missão. No fim das contas, não é o respeito aos direitos humanos que enfraquece o combate. O que enfraquece é operar sem regras, sem clareza e sem técnica.